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Ex-presidente da Petrobras incomoda até aliados ao desembarcar no governo baiano.
Ex-presidente da Petrobras incomoda até aliados ao desembarcar no governo baiano.
Ex-presidente da Petrobras, José Sérgio Gabrielli Marcos Alves / Agência O Globo |
Quem entra na orla marítima de Salvador pela Praia da Armação dá de cara com um barbudo sorridente e engravatado. Muitos ainda não conhecem o rosto estampado no outdoor do Clube dos Empregados da Petrobras (Cepe), ao lado da frase “Desafio sempre será a sua energia” — variante de um famoso slogan da estatal. Mas nos bastidores da política baiana, só se fala dele. O dono da barba é o economista José Sérgio Gabrielli, ex-presidente da Petrobras que há duas semanas desembarcou na capital baiana disposto a ser “um soldado do governador Jaques Wagner (PT)”. Seu projeto, ao sair do comando da maior empresa do país para o governo baiano, é alavancar a candidatura à sucessão estadual.
Depois da tensão para remover os soldados da PM que ocuparam a Assembleia Legislativa, na greve da categoria, a oferta pôs Wagner diante do dilema de acomodar o “soldado Gabrielli” na equipe. É nítida a insatisfação de outros aliados que acalentam as mesmas ambições políticas. Embora a decisão seja aguardada para o meio da semana, pois governador está na Alemanha com a presidente Dilma Rousseff, é provável que o ex-presidente da Petrobras ocupe a Secretaria estadual de Planejamento no lugar de Zezéu Ribeiro (PT), que reassumirá a contragosto o mandato de deputado federal.
— Fiquei um ano montando intensamente projetos de larga escala, com alcance regional e nacional, e na hora de capitalizar isso para a Bahia, eu saio — desabafou semana passada na imprensa local.
Pelo menos outros três petistas sonham encabeçar a chapa da situação em 2014: Rui Costa, secretário-chefe da Casa Civil e amigo de Jaques Wagner há 30 anos; Walter Pinheiro, líder do PT no Senado Federal; e Laura Gramacho, prefeita do município de Lauro de Freitas. O cientista político Jorge Almeira, da Universidade Federal da Bahia (UFBA), descreve o desembarque de Gabrielli como “situação complexa” por suspeitar que o economista não faça parte da lista de preferidos do governador:
— Jaques Wagner não pode negar espaço a ele. É um quadro com autonomia muito grande. Se eleito, não será visto como continuidade. Não é herdeiro do governador.
Conhecido pelo estilo “bateu, levou” exibido nos seis anos a frente da Petrobras, que lhe rendeu a reputação de arrogante, Gabrielli esforça-se agora para demonstrar que o rosto simpático não é só na foto do outdoor. Recebido no aeroporto de Salvador pelos blocos afros Ilê Aiyê, Malê Debalê, Muzenza e Os Negões, ofereceu as bochechas para o beijo das baianas. Até sexta-feira, ele ainda aguardava a confirmação oficial do convite de Wagner. Indagado sobre a candidatura à sucessão, desconversou:
— À sucessão da prefeitura de Salvador, não (sou candidato).
Gabrielli irá a todas as regiões
Ex-professor da UFBA, com doutorado pela Universidade de Boston, Gabrielli foi fundador do PT baiano, partido pelo qual disputou o governo estadual em 1990, perdendo para Antônio Carlos Magalhães. Foi diretor Financeiro e de Relações com Investidores da Petrobras entre 2003 e 2005, quando assumiu a presidência da estatal no lugar de José Eduardo Dutra. É essa a experiência que pretende levar agora para o governo baiano.
— Meu perfil profissional envolve questões relacionadas com gestão, captação de recursos, relacionamento com novos projetos, planos de desenvolvimento. A função será de secretário do estado da Bahia, onde pretendo visitar todas as suas regiões — disse.
A acolhida de Gabrielli na Bahia tem eco no cuidado que a Petrobras dispensa ao estado. Em 2011, foram pelo menos 55 projetos de patrocínio de festas e eventos destinados à Bahia. Grande parte, verbas para o carnaval e para festas de São João. No ano passado, foram R$ 14,7 milhões destinados a projetos que vão do “São João do Dendengoso 2011” (R$ 1,56 milhão) ao patrocínio de evento da Associação de Magistrados da Bahia. Para o carnaval do ano passado, a estatal reservou verba para trios elétricos como Armandinho, Tripodão e Novos Baianos. E também para blocos como o Olodum e o Ileaiê.
Tudo isso serve de munição para os adversários, que o acusam de usar a máquina da Petrobras para popularizar o nome no estado. O ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB), que apelidou Gabrielli de piano de cauda, “por ser grande, vistoso, mas ninguém sabe onde colocar”, chegou reclamar na Petrobras do ex-chefe da Comunicação Institucional da estatal Bahia e hoje deputado estadual Rosemberg Pinto, que teria comandado o esquema de patrocínio cultural de troca de votos. Rosemberg, terceiro mais votado do PT nas últimas eleições, é apontado como o aliado mais próximo de Gabrielli no partido.
— Acho as acusações completamente levianas pois não são substanciadas em fatos, mas em especulações, fofocas e interpretações políticas de adversários — reagiu Gabrielli.
Em 2009, o Ministério Público do Estado abriu inquérito para investigar a ausência de licitação e os contratos de patrocínio da Petrobras com a Associação de Apoio e Assessoria a Organizações Sociais do Nordeste (Aanor) e a Fundação Galeno D’Alvelírio para a promoção do São João no interior baiano. As duas entidades, dirigidas por petistas ligados a Rosemberg,receberam R$ 2,96 milhões, metade para cada, para produzir as festas em 44 municípios em 2008.
MP pode pedir ressarcimento
O MP informou que haverá pedido de ressarcimento ao erário, em futura ação a ser proposta, caso a análise das prestações de contas e a eventual quebra de sigilos fiscal e bancário dos investigados comprovem a aplicação indevida dos recursos financeiros.
— Não há vinculação da estrutura da Petrobras com a política — disse Rosemberg.
A sede do Clube dos Empregados da Petrobras, que exibe o outdoor de Gabrielli, é o quartel-geral da rede petroleira que o apoia. Na ata da diretoria, aparecem aliados como Armando Tripodi, ex-chefe da gabinete do então presidente da estatal. Fora da Bahia, o futuro secretário tem dois aliados: o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, responsável pela sobrevida de Gabrielli na Petrobras por mais um ano, apesar das divergências com Dilma, e o ex-ministro José Dirceu, a quem Gabrielli visitou no ano passado.
— Lula gosta dele. Mas temos de parar com essa história de que Lula é o Deus do Brasil — reclama Geddel.
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