POR OSWALDO VIVIANI
A desembargadora e presidente do TRE, Anildes de Jesus Chaves Cruz, concedeu liminar ao prefeito João Castelo (PSDB) suspendendo os trabalhos da CPI na Assembleia Legislativa que investigava o destino de R$ 73 milhões referentes a convênios celebrados com o Estado do Maranhão.
A desembargadora e presidente do TRE, Anildes de Jesus Chaves Cruz, concedeu liminar ao prefeito João Castelo (PSDB) suspendendo os trabalhos da CPI na Assembleia Legislativa que investigava o destino de R$ 73 milhões referentes a convênios celebrados com o Estado do Maranhão.
Desembargadora e presidente do TRE, Anildes de Jesus Chaves Cruz |
Veja a íntegra da decisão:
Município de São Luís impetra o presente Mandado de Segurança com pedido de liminar, com base no artigo 5º, inciso LXIX, da Constituição Federal, contra Ato da Mesa Diretora da Assembléia Legislativa do Estado do Maranhão e Ato da Comissão Parlamentar de Inquérito da Assembléia Legislativa do Estado do Maranhão que investiga a celebração, execução e o destino dos recursos dos Convênios 04/2009, 05/2009 e 07/2009, consistente na prática de atos indigitados irregulares, dentre os quais destaca a quebra de sigilo bancário da municipalidade.
Aduz o impetrante em sua exordial: que a Comissão Parlamentar de Inquérito instalada pela Assembléia Legislativa do Estado do Maranhão, não tem competência para investigar, diretamente, o ente público municipal; que inexiste “fato determinado” a ser investigado pela CPI.
- em questão posto que a nulidade dos convênios em questão já foi declarada pelo Judiciário com definitividade, e que os numerários repassados pelo Estado do Maranhão ao Muncípio de São Luís por meio dos referidos convênios – um total de 73.500.000,00 (setenta e três milhões e quinhentos mil reais) – fossem devolvidos aos cofres estaduais por meio da retenção mensal da parcela do ICMS destinada a repasse ao Município, por força de repartição tributária, até o limite de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) por mês;
- que a prestação de contas dos gastos municipais é devida somente à Câmara de Vereadores de São Luís, bem como somente este órgão é competente para apurar a malversação de valores incorporados ao erário municipal, sendo que ao Tribunal de Contas do Estado cabe a fiscalização de repasses de verbas estaduias à municipalidade;
- que é irregular a açodada determinação de quebra de sigilo bancário do impetrante;
que a CPI em referência possui puro caráter político, o que afronta o primado da Isonomia;
- que o relator da CPI é suspeito para a condução dos trabalhos. Ao final, pugna pela concessão de liminar, no sentido de ser determinado o sobrestamento dos trabalhos da multicitada Comissão Parlamentar de Inquérito, tornando sem efeito os Mandados de Notificação nos 001 a 009 de 2011, e que, quando do julgamento do mérito seja determinado o trancamento definitivo da referida CPI.
A impetração veio acompanhada dos documentos de fls. 31/639. O writ foi originalmente impetrado no Plantão Judiciário do Segundo Grau, sendo que o Desembargador-plantonista, Dr. José Luiz Oliveira de Almeida, entendeu não ser caso de utilização daquela via excepcional, pelo que encaminhou os autos à distribuição (fls. 637/638). É o que cabe relatar.
Decido.
Presentes os pressupostos de admissibilidade, conheço do presente writ. Ab initio, cabe destacar que a análise prelibativa ora realizada passará ao largo das alegações de perseguições e confrontos políticos, pois, não é dado ao Judiciário se imiscuir em tal seara.
Pois bem. Para a concessão de medida liminar em Mandado de Segurança, a lei de regência exige a presença de dois requisitos autorizadores: fumus boni juris (relevância dos motivos em que se assenta o pedido na inicial) e o periculum in mora (possibilidade da ocorrência de lesão irreparável ao direito do impetrante se vier a ser reconhecido na decisão de mérito).
Da análise do presente writ, antevejo a presença da relevância dos motivos em que se assenta a inicial – fumus boni juris – aptos à concessão da liminar pleiteada. De fato, inicialmente é imperioso vislumbrar que, o art. 32, caput e § 3º, da Constituição do Estado do Maranhão, prescrevem, respectivamente: “Art. 32. A Assembléia Legislativa terá Comissões permanentes e temporárias, constituídas na forma e com as atribuições previstas no respectivo regimento ou no ato de que resultar sua criação. § 3º. As Comissões Parlamentares de Inquérito, que terão poderes de investigação próprios das autoridades judiciais, além de outros previstos no Regimento Interno, serão criadas mediante requerimento de um terço dos membros da Assembléia Legislativa, para a apuração de fato determinado e por prazo certo, sendo suas conclusões, se for o caso, encaminhadas ao Ministério Público, para que promova a responsabilidade civil ou criminal dos infratores.” (grifei) Assim, as Comissões Parlamentares de Inquérito instituídas no seio da Assembléia Legislativa de nosso Estado, possuem como pressuposto objetivo de constituição a Motivação, visto que serão sempre destinadas à “apuração de fato determinado”.
In casu, em um exame superficial, não é verificável qual o “fato determinado” da CPI em tela, posto que a alegada necessidade de investigação da celebração, execução e o destino dos recursos dos Convênios nos 04/2009, 05/2009 e 07/2009, aparentemente, não se justifica, haja vista que o juiz da 4ª Vara da Fazenda Pública da Capital, nos autos da Ação Popular nº 0008396-952009.8.10.0001, em 31/03/2009, deferiu a antecipação de tutela pleiteada, determinando a suspensão dos convênios celebrados entre o Estado do Maranhão e seus municípios, a partir de 04/03/2009 (fls. 221/225), decisão esta complementada por meio do pronunciamento de fls. 226/242, datado de 05/05/2009, no qual consta um rol de convênios dentre os quais os ora referidos (fl. 228).
Destaque-se que tais determinações foram enfrentadas por meio do Agravo de Instrumento nº 012956/2009, que tramitou nesta Corte sob a Relatoria do Des. Jaime Ferreira de Araújo, o qual não foi conhecido por falta de pressuposto de admissibilidade recursal (fls. 319/323), mantendo, in totum, a decisão do juiz singular.
Extrai-se, ainda, dos autos, que os convênios que a CPI da Assembléia Legislativa do Maranhão, já tiveram sua irregularidade prontamente reconhecida pelo Judiciário, sendo que as decisões referidas determinaram, de forma expressa, a devolução dos numerários repassados aos municípios maranhenses pelo Poder Executivo estadual, nos derradeiros dias da administração do finado Governador Jackson Klepler Lago.
Ademais, não bastasse a reconhecida sustação dos convênios em referência, importante verificar que os prejuízos ao erário estadual já estão sendo reparados, haja vista que, o Estado do Maranhão, em 22/06/2011, propôs a Ação Cautelar Inominada nº 28138-382001.8.10.0001, contra o Município de São Luís, visando receber de volta o montante repassado pelos convênios sub examem (424/231), sendo que o magistrado da 4ª Vara da Fazenda da Capital, em 01/12/2011, após ouvir a municipalidade, deferiu a antecipação de tutela, autorizando a Administração estadual a efetuar a retenção mensal da parcela do ICMS destinada a repasse ao Município de São Luís, por força de repartição tributária, até o limite de R$ 2.000.000,00 (dois milhões de reais) por mês (fls. 491/495), sendo que a medida vem sendo regularmente cumprida desde o seu deferimento, consoante se vê das correspondências expedidas pelo Banco do Brasil S/A às fls. 510 e 518.
Dessa forma, tendo-se constatado que os Convênios nos 04/2009, 05/2009 e 07/2009, já tiveram sua irregularidade expressamente reconhecida pelo Poder Judiciário e que, também via pronunciamento judicial, o Estado do Maranhão já está sendo ressarcido o prejuízo a seu erário por meio seguro, sem possibilidade de inadimplemento – retenção de numerário destinado á repartição tributária do ICMS -, não vislumbro, neste juízo preliminar, qual a “apuração de fato determinado” será objeto da Comissão Parlamentar de Inquérito questionada.
Mas não é só! Ainda no concernente à demonstração da plausibilidade das alegações do impetrante, verifico que se afigura a irregular ingerência do Poder Legislativo estadual na Administração municipal ludovicense.
De fato, consoante preceitua a Constituição Federal: “Art. 18. A organização político-administrativa da República Federativa do Brasil compreende a União, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, todos autônomos, nos termos desta Constituição.” “Art. 30. Compete aos Municípios: III – instituir e arrecadar os tributos de sua competência, bem como aplicar suas rendas, sem prejuízo da obrigatoriedade de prestar contas e publicar balancetes nos prazos fixados em lei;” “Art. 31. A fiscalização do Município será exercida pelo Poder Legislativo Municipal, mediante controle externo, e pelos sistemas de controle interno do Poder Executivo Municipal, na forma da lei. § 1º. O controle externo da Câmara Municipal será exercido com o auxílio dos Tribunais de Contas, dos Estados ou do Município ou dos Conselhos ou Tribunais de Contas dos Municípios, onde houver.”
Portanto, a autonomia dos entes federados impede que, em casos como o presente, a Assembléia Legislativa do Estado interfira na Administração Pública municipal, haja vista que tal papel é dado à Câmara Municipal, com o auxílio do Tribunal de Contas do Estado. In casu, quando muito, poderia a referida CPI se destinar à apuração de irregularidades acaso perpetradas pelo Executivo estadual na celebração de tais convênios, entretanto, como se vê dos autos, este exame prelibativo denota que o direcionamento da comentada Comissão Parlamentar de Inquérito é, especificamente, o Executivo municipal ludovicense, posto que sua medida primeira foi determinar a quebra do sigilo bancário do referido Poder.
Aliás, tal determinação também reforça o fumus boni iuris ora examinado, considerando que a quebra do sigilo bancário é medida tida por excepcionalíssima com relação aos particulares, o que se dizer na presente situação, em que se deseja a intervenção nas contas bancárias de um ente federado, o qual, ante a Supremacia do Interesse Público, coloca-se em patamar mais elevado em relação aos administrados.
Demais disso, há que se notar que a medida em comento, mesmo sendo excepcional, foi determinada logo na primeira reunião dos componentes da CPI (fls. 526/529), sem que a municipalidade fosse ao menos notificada para prestar esclarecimentos prévios. Por todos estes motivos, dentro deste exame superficial, considero como demonstrada a fumaça do bom direito, autorizadora da concessão da liminar requerida. Quanto ao periculum in mora, este reside na ameaça de efetivação das medidas extremas determinadas pela Comissão Parlamentar de Inquérito em referência, dentre as quais se destaca a quebra do sigilo bancário do Município de São Luís, determinada por meio dos Mandados de Notificação nº 001 a 009, de 2011 (fls. 530/537).
Com essas considerações, porque preenchidos os requisitos legais autorizadores, DEFIRO O PLEITO DE LIMINAR, determinando o sobrestamento das investigações feitas pela referida Comissão Parlamentar de Inquérito, assim como se abstenha de proceder a devassa no sigilo bancário das contas do ente municipal, ou atos similares, e, em consequência, tornar sem efeitos os Mandados de Notificação nº 001 a 009, de 2011, até o julgamento do mérito do presente mandamus. Intimem-se as partes da presente decisão. Comunique-se, igualmente, as autoridades nominadas nos Mandados de Notificação nº 001 a 009, de 2011, servindo cópias desta como ofícios. Notifiquem-se as autoridades apontadas como coatoras para, querendo, prestar informações no prazo legal. Após, encaminhem-se os autos para a Procuradoria Geral de Justiça. Publique-se. Cumpra-se. São Luís/MA, 12 de janeiro de 2012.
Des. Anildes de Jesus Bernardes Chaves Cruz
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